Me dirijo hoje aos sonhadores e criativos – ativos ou adormecidos. Aqueles que vivem sua rotina em volta de uma arte ou um sonho, e àqueles que não tiveram a coragem ou oportunidade de começar.
Não é todo lugar que podemos falar abertamente das nossas paixões. As vezes os amigos não entendem, ou não se conectam. Dificilmente a família está interessada em quem somos de verdade, mais preocupados com o papel social que cumprimos nas visitas esporádicas. Podem até sentir orgulho, simpatizar e apoiar (se você tem isso, é uma mina de ouro), mas não é o mesmo que ter pessoas que pegam o fio invisível da imaginação com você e estão ao seu lado enquanto toda a transmutação entre ideia e projeto está acontecendo.
Quando somos artistas, há um processo para apresentarmos nosso trabalho para o mundo que envolve vários desafios:
A difícil jornada de encontrar o público que irá se cativar e valorizar a sua ideia e talento;
A busca pela aceitação de que independente de ser um trabalho principal ou dedicação que você tem nas horas livres, é ali que está seu coração.
O desenvolvimento amargo que é lidar com as próprias inseguranças e medos.
A aprovação social de que a arte consegue fazer dinheiro (uma das melhores formas de massacrar potencial criativo, se me perguntarem).
Lidar com a divulgação do próprio trabalho e criação de conteúdo, que muitas vezes leva mais tempo e trabalho do que a arte em si.
É maravilhoso termos acesso a redes sociais e formas sem fim de divulgar nosso trabalho, impulsionar postagens e colher os frutos com uma boa estratégia e um curto período de tempo. Nem posso imaginar como seria divulgar meus livros nos anos 2000, onde uma coluna na Capricho ou uma nota na revista Veja era a única forma de encontrar meu público, e um investimento caríssimo.
Contudo, ter acesso a tantos indicativos instantaneamente, tira o foco da perspectiva de que uma carreira é uma trajetória de anos. Que o vídeo que viralizou vai ditar o rumo do seu mês, não necessariamente do seu ano. Que o sucesso do coleguinha do ramo, não vai ofuscar o seu trabalho pois há espaço para todos brilharem.
Nossa cabecinha ainda é bastante pré-histórica, biologicamente falando. O cérebro humano não fez grandes atualizações nos últimos milhares de anos, quando nos organizávamos em grupos de umas centenas de pessoas.
O acesso que temos a milhares de ideias, campos de interesse e opiniões, é literalmente demais para que possamos compreender plenamente.
Me assusta pensar que nunca houve tanta informação disponível, e ainda assim, a desinformação é uma dos maiores males da década, só que isso é assunto para outro dia.
Hoje, quero focar que sim, o mundo é um ambiente hostil para pessoas que tem sonhos, e precisam conviver com a própria análise de dados e prospecção de carreira da solidão de sua tela, além de lidar com críticas destrutivas ou com as próprias questões de saúde mental.
Só que o Universo, é um lugar seguro. Tão infinito na sua complexidade e mistérios, que quando vemos que somos só um sopro de vida flutuando no Cosmos, podemos ter esperança de que as ideias vieram até nós por algum motivo. Sonhar dá a nossa existência flíngebe (precisei inventar uma palavra aqui, não estava encontrando uma melhor e essa retrata direitinho o que eu quero dizer. Depois aviso ao Aurélio.) um propósito para estarmos vivos. Exercer nossa arte, brinca com nosso senso de imortalidade, em pensar que algo que fizemos vai ter importância no curso da história da humanidade.
Sendo sincera, vendo a história da humanidade me dá pouquíssimo orgulho de fazer parte. Só tem guerras e decisões estúpidas tomadas por mais ouro ou mais território, a única coisa que salva e nos absolve, é a arte.
Corvos fazem arte nos seus ninhos, e as baleias, cantando, talvez seja uma boa opção para outra vida.
Enfim, quando penso na arte – e somente nela –, me sinto segura. O papel não me julga. A caneta não me condena se me vê errar. O piano não vai embora se erro uma nota. A arte me perdoa e me absolve, e ela nunca exigiu de mim perfeição, dinheiro ou status.
A arte só me pede para existir.
E eu, sozinha no meu universo de pensamentos, existo com ela.
Deixa um coraçãozinho se algo desse texto tocou seu coração, e adoraria ler um comentário seu sobre o que pensa desse assunto.
Curti teu texto! Enquanto eu estava lendo, você soltou uma frase que me fez correr pro guarda-roupa e ficar folheando livros, até achar justamente o que eu li e que expressou MUITO essa ideia da sua frase:
"Sendo sincera, vendo a história da humanidade me dá pouquíssimo orgulho de fazer parte. Só tem guerras e decisões estúpidas tomadas por mais ouro ou mais território, a única coisa que salva e nos absolve, é a arte."
E essa questão da arte é tocante e profunda. Se me dá licença, olha esse trecho aqui de "O Retrato de Dorian Gray"
" O artista é o criador de coisas belas.
[...]
Nenhum artista é jamais mórbido. O artista é capaz de expressar tudo.
O pensamento e a linguagem são para o artista, instrumentos de uma arte.
O vício e a virtude são para o artista materiais de uma arte.
Do ponto de vista da forma, o tipo perfeito de todas as artes é a arte do músico. Do ponto de vista do sentimento, o tipo perfeito é o ofício do ator.
Toda arte é ao mesmo tempo superfície e símbolo.
Aqueles que buscam algo por baixo da superfície fazem-no por conta e riscos próprios.
É o espectador, e não a vida, que a vida realmente espelha.
A diversidade de opiniões sobre uma obra de arte mostra que a obra é nova, complexa e vital.
Quando os críticos discordam, o artista está de acordo consigo mesmo.
Podemos perdoar um homem por fazer uma coisa útil desde que ele não a admire. A única desculpa para se fazer uma coisa inútil é que a admiremos intensamente.
Toda arte é bastante inútil.
- Oscar Wilde."
Talvez tenha ido um pouco além, mas é uma visão de como a arte, historicamente, é minimamente apreciada para quem só viu um país ser construído por meio de papeis sociais e econômicos, ou melhor, tenha feito parte disso. "Toda arte é bastante inútil" do ponto de vista externo, lucrativo ou realista até demais.
Já tive pessoas que discordaram dessa minha fala, mas a vida deve ser mais apreciada no sentido de romantismo, sem ignorar o realismo e o que acontece à nossa volta. Mas já que nada verdadeiramente faz sentido, encontrar um romantismo de apreço à arte é o que me mantém vivo, interessado.
Obrigada demais por existir fada 😭💖✨